domingo, 8 de novembro de 2009
Perfil desejado para o professor de Geografia
O espaço geográfico é formado pela articulação entre objetos técnicos e informacionais, fluxos de matéria e informação e objetos naturais. Assim ele não é meramente um substrato sobre o qual as dinâmicas sociais se desenrolam: é uma dimensão viva dessas dinâmicas. O ensino de geografia destina-se a formar cidadãos capacitados a decifrar a sociedade, por meio de sua dimensão espacial.
No mundo contemporâneo, marcado pela aceleração dos fluxos e pelo elevado conteúdo de ciência e tecnologia nos processos produtivos, a trama que constitui o espaço se articula numa totalidade mundial. Mas o mundo se expressa desigualmente nos territórios nacionais, nas regiões e nos lugares. Esse jogo escalar é uma ferramenta indispensável para o ensino de geografia, pois as escalas geográficas estão sempre interrelacionadas: é preciso, por exemplo, considerar o mundo, a região e o território nacional na análise dos fenômenos que ocorrem no lugar.
O processo de urbanização, por exemplo, quando analisado na escala global, revela-se descompassado: no século XIX, com a emergência do sistema técnico, o mundo conheceu a primeira grande onda de urbanização, praticamente circunscrita aos países em processo de industrialização; a partir de meados do século XX, o ritmo da urbanização se acelera nos países mais pobres, impulsionado sobretudo pela falência das estruturas rurais tradicionais. O mesmo processo pode ser analisado na escala dos territórios nacionais, revelando as disparidades regionais internas e a lógica das redes urbanas. No espaço intra-urbano, por sua vez, a trama de objetos técnicos e naturais revela-se sempre única e particular, ainda que conectada ao espaço global.
A preocupação com esse jogo escalar orientou tanto a elaboração do corpo de competências e habilidades quanto a seleção da bibliografia. A prova volta-se para avaliar o domínio sobre o conteúdo curricular, que abrange tanto as competências e habilidades quanto o corpo de conceitos que perpassam os conteúdos programáticos.
Por isso mesmo, o arcabouço conceitual da geografia deve estar incorporado na prova, pois ele é o ponto de partida para uma reflexão organizada sobre a dimensão espacial da sociedade. Diversas obras presentes na bibliografia dedicam-se a esse tema. Mas esses conceitos só adquirem relevância se forem mobilizados para desvendar a dimensão espacial dos arranjos econômicos, das estratégias políticas e das identidades culturais.
A prova aferirá se os professores são capazes de operacionalizar os conceitos para decifrar a lógica das políticas públicas territoriais, dos movimentos sociais, da localização espacial das empresas, do agronegócio e do ambientalismo, além de outras tantas que integram o temário da geografia. Mais do que isso, os conceitos devem ser usados pelo professor para ensinar os alunos que essas lógicas muitas vezes se enfrentam: o fazendeiro que quer produzir mais e o ambientalista que luta por uma legislação mais rigorosa são portadores de visões de mundo diferentes. O professor deve ensinar os alunos a se posicionarem de forma autônoma frente a essas diferenças. Como afirmou o mestre Milton Santos, o território pode ser visto como recurso ou como abrigo. Cabe ao professor de geografia reconhecer e saber fazer reconhecer a diferença entre um e outro.
O professor de Geografia deve apresentar o seguinte perfil:
1. Reconhecer e dominar conceitos e diferentes procedimentos metodológicos com vistas a desenvolver a análise e a formulação de hipóteses explicativas acerca da produção do espaço geográfico e da articulação de diferentes escalas geográficas.
2. Reconhecer o caráter provisório das ciências diante da realidade em permanente transformação, considerando a importância das concepções teóricas e metodológicas da Geografia para o desenvolvimento do conhecimento humano.
3. Demonstrar o domínio do conhecimento de ciências afins da Geografia que contribuam para ampliar a capacidade de interpretação, argumentação e expressão da realidade geográfica, numa perspectiva interdisciplinar.
4. Compreender os fundamentos e as relações espaço temporais pretéritas e atuais do planeta com vistas a identificar, reconhecer, caracterizar, interpretar, prognosticar fatos e eventos relativos ao sistema terrestre e suas interações com as sociedades na produção do espaço geográfico em diferentes escalas.
5. Compreender a importância e as diferentes formas de aplicação de inovações teóricas, metodológicas e tecnológicas para o avanço da pesquisa e do ensino em Geografia, considerando a aprendizagem da linguagem cartográfica. 6. Reconhecer o papel das sociedades nas transformações do espaço geográfico, decorrentes das inúmeras relações entre sociedade e natureza, articulando procedimentos empíricos aos referenciais teóricos da análise geográfica com vistas a elaborar propostas de intervenção solidária em processos sócioambientais.
7. Compreender as formas de organização econômica, política , social do espaço mundial e brasileiro, resultantes da revolução tecnocientífica e informacional expressa pela aceleração e intensificação dos fluxos da produção, do consumo e da circulação de pessoas, informações e ideias.
8. Aproveitar as situações de aprendizagem disponíveis no material didático ampliando-as por intermédio de novos contextos, recursos didáticos e paradidáticos, considerando a realidade local, de modo a ampliar o repertório de leitura de mundo dos alunos.
9. Aplicar diferentes formas de avaliação do ensino-aprendizagem, considerando-as como parte primordial do processo de aquisição do conhecimento, reconhecendo o seu caráter processual e sua relevância na aprendizagem.
10. Compreender a importância curricular de aprendizagens relativas aos processos histórico-geográficos relativos à formação cultural, política e sócio-econômica da América e da África, considerando sua relevância e influência na formação da identidade brasileira e latino americana.
Habilidades do professor de Geografia
Com base nas Competências Gerais espera-se que os professores estejam aptos a:
1. Observar, descrever e analisar o uso e apropriação do território brasileiro, considerando a formação sócio-espacial e as transformações da divisão territorial do trabalho.
2. Comparar os contextos geográficos e a produção do lugar social, no espaço e no tempo, a partir da análise da formação do Estado Nação em diferentes regiões, das fronteiras internacionais e da ordem mundial.
3. Ler e interpretar a dinâmica da paisagem, identificando interações entre elementos dos sistemas naturais e padrões e tendências das mudanças locais e globais.
4. Ler, interpretar e representar formas, estruturas e processos espaciais, demonstrando o domínio de linguagens numéricodigitais, gráficas e cartográficas.
5. Reconhecer, aplicar e estabelecer relações entre conhecimentos geográficos na interpretação de textos jornalísticos, documentos históricos, obras literárias e outras manifestações artísticas, como pinturas, esculturas, músicas, danças e projetos arquitetônicos.
6. Utilizar os diversos produtos e técnicas cartográficas, para localizar-se no espaço, visualizar informações, de modo a identificar razões e intenções presentes nos fenômenos sociais e naturais, com vistas a explicar e compreender as diferentes formas de intervenção no território e as lógicas geográficas desses fenômenos.
7. Identificar problemas e propor soluções decorrentes do uso e da ocupação do solo no campo e na cidade, considerando as políticas de gestão e de planejamento urbano, regional e ambiental.
8. Realizar escolhas mais adequadas de técnicas e procedimentos de análise da dinâmica ambiental, de estudos populacionais
e da produção econômica do espaço geográfico.
9. Situar o Brasil na geopolítica mundial, considerando a globalização e sua inserção na América Latina e nos blocos econômicos internacionais.
10. Reconhecer as distintas abordagens de análise do espaço agrário no Brasil e no mundo, confrontando diferentes pontos de vista.
11. Comparar padrões espaciais gerados pela produção agropecuária e pelas cadeias produtivas industriais e pelas novas formas de gestão no campo.
12. Compreender as transformações do mundo do trabalho a partir das inovações tecnológicas e das interações entre diferentes lugares na economia flexível.
13. Interpretar dados e indicadores de diferentes formas de desigualdade social organizados em tabelas ou expressos em gráficos e cartogramas.
14. Fazer prognósticos a respeito da crise ambiental, estabelecendo relações de causa e efeito da intervenção humana nos ciclos naturais, fluxos de energia e no manejo de recursos naturais.
15. Discriminar as relações assimétricas de poder entre os organismos internacionais (Banco Mundial, FMI, diferentes organismos da ONU), os estados nações, as corporações transnacionais e as organizações não-governamentais.
16. Comparar propostas de regionalização do espaço mundial a partir de parâmetros econômicos, políticos e étnicoreligiosos.
17. Avaliar a situação de diferentes países e regiões da África e da América, considerando as transformações econômicas recentes e a inserção desigual e diferenciada no mercado mundial.
18. Explicar os processos geológicos e geofísicos e suas interações com a evolução da vida e a organização dos domínios morfoclimáticos.
19. Analisar o processo de urbanização mundial, com destaque para a metropolização, explicando a importância das cidades globais nos circuitos da economia-mundo.
20. Discutir a dinâmica demográfica, avaliando as políticas migratórias e a situação dos refugiados internacionais.
Bibliografia para Geografia
1. AB’SABER, Aziz. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê, 2007.
2. CASTELLS, Manuel. A Galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
3. CASTROGIOVANNI, A. Carlos;, Helena C.; KAERCHER, Nestor André. Ensino de Geografia: práticas e textualizações no cotidiano. Porto Alegre: Mediação, 2001.
4. DURAND, Marie-Françoise (et. alli), Atlas da Mundialização: compreender o espaço mundial contemporâneo; tradução de Carlos Roberto Sanchez Milani. Saraiva: SP, 2009.
5. ELIAS, Denise. Globalização e Agricultura. São Paulo: Edusp, 2003.
6. GUERRA, José Teixeira; COELHO Maria Célia Nunes. Unidades de Conservação: abordagens e características geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.
7. HAESBAERT, Rogério; PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. A nova des-ordem mundial. São Paulo: Unesp, 2006.
8. HUERTAS, Daniel Monteiro. Da fachada atlântica à imensidão amazônica: fronteira agrícola e integração territorial. Fapesp/Annablume/Banco da Amazônia: São Paulo, 2009
9. MAGNOLI, Demétrio. Relações Internacionais: teoria e história. SP:Saraiva, 2004.
10. MARTINELLI, Marcelo. Mapas da Geografia e da Cartografia Temática. São Paulo: Contexto, 2003.
11. SALGADO-LABOURIAU, Maria Léa. História ecológica da Terra. São Paulo: Edgard Blücher, 1996.
12. SANTOS, Milton. Por uma outra Globalização. Rio de Janeiro: Record, 2004.
13. SOUZA, Marcelo Lopes. O ABC do Desenvolvimento Urbano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.
14. THÉRY, Hervé; MELLO, Neli Aparecida. Atlas do Brasil. Disparidades e dinâmicas do território. São Paulo: EDUSP, 2008
15. TOLEDO, Maria Cristina Motta de; FAIRCHILD, Thomas Rich; TEIXEIRA, Wilson. Decifrando a Terra. São Paulo: Ibep, 2009.
Documentos para Geografia
1. BRASIL, Ministério da Educação. ENCCEJA. História e geografia, ciências humanas e suas tecnologias: livro do professor- ensino fundamental e médio/Coordenação Zuleika de Felice Murrie. Brasília: MEC/INEP, 2002. 2. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Orientações Curriculares para o Ensino Médio – Ciências Humanas e suas Tecnologias - Geografia. Brasília, MEC/SEB,
2006.
3. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros Curriculares Nacionais - Geografia. Brasília, MEC/SEB, 1998.
4. SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação. Proposta Curricular do Estado de São Paulo para o ensino de Geografia para o Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio. São Paulo: SE, 2008. Disponível em: http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/Portals/18/arquivos/Prop_GEO_COMP_red_md_20_03.pdf
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