Ética e Competência
RIOS, Terezinha Azeredo
Editora Cortez
A
educação está envolvida no contexto social ao qual ela está inserida.
Enquanto fenômeno histórico e social, a educação é a transmissão de
cultura, é o estabelecimento. A cultura é a relação da educação e a
sociedade, o mundo transformado pelo homem, porque o homem é um
ser-no-mundo, o mundo está dentro do homem, há uma reciprocidade, pois o
homem dele se resulta. O mundo existe para o homem na medida do
conhecimento que o homem te dele e da ação que exerce sobre ele. O mundo
se apresenta ao homem num aspecto de natureza, onde o mundo independe
do homem para existir e que os próprios homens fazem parte em seus
aspectos biológicos, fisiológicos. Existe um outro aspecto que é o da
cultura, o mundo transformado pelo homem. Os homens fazem a cultura por
necessidade, por sobrevivência, para satisfazer essas necessidades eles
Poe em ação sua razão e sua criatividade. O homem é um ser de desejos
colados às necessidades. Os desejos se manifestam como fonte do humano,
propulsores da passagem do estabelecimento para o inventado. O conceito
de desejo indicara a presença da liberdade associada à necessidade.
O
senso comum identifica a cultura como erudição, acúmulo de
conhecimentos, atividade intelectual. Os cientistas sociais,
antropólogos, conceituam cultura como tudo o que resulta da
interferência dos homens no mundo que os cerca e do qual fazem parte.
Ela se constitui no ato pelo qual ele vai de homo sapiens a ser humano.
Assim, todos os homens são cultos, na medida em que participa, de algum
modo da criação cultura, estabelecem certas normas para sua ação,
partilham, valores e crenças. Tudo isso é resultado do trabalho. Por
isso não se fala em cultura sem falar em trabalho, intervenção
intencional e consciente dos homens rna realidade. É o trabalho que faz
os homens saberem, serem. O trabalho é a essência do homem. A idéia de
trabalho não se separa da idéia de sociedade, na medida em que é com os
outros que o homem trabalha e cria a cultura. No trabalho o homem começa
a produzir a si mesmo, os objetos e as condições de que precisa para
existir. A primeira coisa que o homem produz é o mundo, mas o mundo
tornado humano pela presença do homem e pela organização social que,
pelo trabalho, lhe impõe.
Qualquer sociedade se organiza como base na
produção da vida material de seus membros e das relações decorrentes. A
cultura precisa ser preservada e transmitida exatamente porque não está
incorporada ao patrimônio natural. A educação, no sentido amplo, está
definida como processo de transmissão de cultura, está presente em todas
as instituições, ou seja, escolas. Escola é o espaço de transmissão
sistemática do saber historicamente acumulado pela sociedade, com o
objetivo de formar indivíduos, capacitando-os a participar como agentes
na construção dessa sociedade.
A sociedade capitalista se caracteriza
por ter sua organização sustentada numa contradição básica –aquela que
se dá entre capital e trabalho - e que provoca a divisão de seus membros
em duas classes antagônicas, a classe burguesa e a trabalhadora. Na
sociedade capitalista, a escola, enquanto instituição, tem sido o espaço
de inserção dos sujeitos nos valores e crenças da classe dominante. A
ideologia liberal é o elemento de sustentação do sistema capitalista,
este conjunto de idéias, crenças, valores, ganha corpo e solidifica,
dissimulando a realidade por interesses da classe dominante. Assim, as
diferenças sociais, as discriminações, são justificadas com base em
princípios considerados um contexto histórico especifico. Isso é
evidente na escola brasileira. Ela é transmissora do saber sistematizado
acumulado historicamente, mas deveria ser fonte de apropriação da
herança social pelos que estão no seu interior. Entretanto, a população
está excluída do processo educativo formal, a maioria que freqüenta a
escola está não tem oferecido condições para aquela apropriação. A
relação escola-sociedade, a escola é parte da sociedade e tem com o todo
uma relação dialética, uma interferência recíproca e social. E
contraditória, pois é um fator de manutenção e que transforma a cultura.
Ela tem um conjunto de práticas que mantêm e transforma a estrutura
social.
A ação dos homens em sociedade é uma ação de caráter
político, que onde o poder é um elemento presente como constituinte do
social. A idéia de política esta associada ao poder, e a medida a
organização da vida material determina a organização das idéias e
relações de poder. Não há vida social que não seja política, pois se
toma partido, de situações, não ficar indiferente em face das
alternativas sociais, participar e produzir em relação com toda a vida
civil e social, é ter um conjunto de intenções como programa de ação.
É
preciso refletir sobre os objetivos específicos da educação, para
distinguirmos da prática política, mas vemos esta pratica, na ação
educativa.
A função da educação tem uma dimensão técnica e política.
O pedagogo realiza a dimensão política na prática educativa, preparando
o cidadão para a vida na polis, transmitindo saber acumulado e levando a
novos saberes; tecnicamente significa dizer, que a criação de conteúdos
e técnicas que possam garantir a apreensão do saber pelos sujeitos e a
atuação no sentido da descoberta e da invenção. Conteúdos e técnicas são
selecionados, transmitidos e transformados em função de determinados
interesses existentes na sociedade. O papel político da educação se
revela na medida em que se cumpre as perspectiva de determinado
interesse, está sempre servindo as forças que lutam para perpetuar e /
ou transformar a sociedade. A escola da sociedade capitalista não tem
caráter democrático, socializando o saber e recurso para apreendê-lo e
transformá-lo, porque ela tem estado a serviço da classe dominante,
veiculando a ideologia dessa classe. A escola quer formar o cidadão
dócil e o operário. É necessário refletir e encontrar caminhos para sua
transformação.
Os papeis sociais do educado são definidos levando-se
em consideração as instituições onde esse desenvolve a prática dos
sujeitos. O educador desenvolve sua prática no espaço da instituição que
é a escola. É tarefa da escola a transmissão / criação sistematizada da
cultura entendida como resultado da intervenção dos homens na realidade
transformando-a e transformando a si mesmos. A escola tem
características específicas e cumpre uma função determinada que resulta
do trabalho e das relações estabelecidas em seu interior e na prática
desses sujeitos. O educador exerce sua função tem que realizar suas
obrigações e uma maneira especifica usando-se de competência, saber
fazer bem, técnica e politicamente. Isto na prática significa, ter
domínio no saber escolar, habilidade de organizar e transmitir esse
saber, organizar os períodos de aula, desde o momento da matrícula,
agrupamento de classes, currículo, e métodos de ensino, saber relacionar
o preparo técnico da escola e os resultados de sua ação, e compreender a
relação escola e sociedade.
O sentido político da prática docente se
realiza pela mediação da competência técnica. Fazer bem é ir de
encontro daquilo que é desejável, está vinculado às aspectos técnicos e
políticos da atuação do educador. A ética é a mediação, pois defini a
organização do saber que será vinculado na instituição escolas e na
direção que será dada a esse saber na sociedade. A qualidade da educação
tem sido prejudicada por educadores preocupados em fazer o bem, sem
questionar criticamente sua ação. O maior problema que se enfrenta no
que diz respeito as dimensões técnica e política da competência do
educador, é a desarticulação na realidade. O saber fazer técnico
constitui condições necessária porque é a base do querer político, ainda
que a dimensão política da tarefa docente não seja percebida como tal.
Com
respeito à relação existente dentre moral e política, se percebe que os
educadores não têm clareza da dimensão política de seu trabalho. Ao
interpretarem política como envolvimento partidário, ou mesmo sindical,
alguns até negam que tenham algo a ver com isso. Não podem se recusar a
admitir a presença da moralidade em sua ação. Essa moralidade aparece de
forma extremada – o moralismo.
A idéia de responsabilidade que se
encontra articulada com a de liberdade, conceito que representa o eixo
central da reflexão ética está ligada à noção de compromisso político e
moral. Os professores não têm clareza quanto a implicação política de
seu comprometimento, vêem como parte de uma essência do educador. As
mulheres educadoras dão-se ênfase a afetividade. Ao desconhecimento na
presença político na ação educativa e ético, aparece misturado com o
sentimento e essa mistura contribui para reforçar o espontaneismo e para
manter as falhas da instituição escolar.
É necessário evitar o
moralismo, mas não é possível desvincular moral e política, buscar
discutir os valores morais dominantes na sociedade. A ética da
competência pode ajudar-nos a desvelar elementos da ideologia que
permeia nossa educação. Não há como afastar a subjetividade que está
presente na valorização, na intencionalidade que se confere a prática
social.
É preciso distinguir subjetividade de singularidade ou
individualidade. O singular é o que diz respeito ao individuo, as
pessoas de sua atuação que o distinguem dos demais e é na vida em
sociedade que ele adquire essa individualidade.
O comportamento do
homem é político enquanto razão e palavra. E a moralidade são as
escolhas exigências de caráter social no que se chama de técnico no
ensino, no trabalho educativo. Essas escolhas têm implicações
ético-política. Vontade, liberdade, conseqüência são conceitos do
terreno ético político. A articulação entre esses conceitos é que nos
auxilia na busca da compreensão da com potência do educador, pois não
basta levar em conta o saber, mas é preciso querer. O saber e a vontade
nada valem sem a explicitação do dever e a presença do pocer
desvinculado da dominação. Mas no poder na conjugação de possibilidades e
limites representando pelas normas que regem a prática dos homens em
sociedade. Deveres que se combinam com direitos e estão ligados à
consciência e a vontade dos sujeitos.
Ao lado do saber que se
identifica com o domínio dos conteúdos e das técnicas para a transmissão
temos o saber que sabe, a consciência de percepção da realidade crítica
e reflexiva.
A visão crítica é um primeiro passo a ter um compromisso político. Depois a vontade e a intencionalidade do gesto do educador.
A
necessidade presente no contexto socioeconômico é o primeiro motor de
ação do educador, a vontade de articular a consciência é essencial a
prática político moral do educador a liberdade responsável. O educador
deve associar a coletividade rompendo com a idéia dominante do
pensamento burguês que é a de individualismo.
A idéia de promessa
dá-se a noção de compromisso, o empenho da prática e envolvimento com a
realização do prometido. Na maioria das situações é preciso criar essas
circunstâncias. O gesto de compreensão e a ética no envolvimento com
aquilo que se tem por objetivo. Compreensão é saber aprofundado e
envolvimento ético-politico do saber.
É preciso que o educador
competente seja um educador comprometido com a construção de uma
sociedade justa, democrática interferindo no real e na organização de
relações de solidariedade e não de dominação entre os homens.
A
escola deve ser um espaço de predominância do consenso e da persuasão.
Onde o consenso resultaria de aproveitar o espaço existente na sociedade
civil para seu fortalecimento e para a transformação necessária na
estrutura social.
A dimensão técnica carrega a ética, onde a ética é a
mediação da técnica e da política expressando a escolha técnica e
política dos conteúdos, dos métodos, dos sistemas de avaliação e os
desvendando-os.
Técnica, ética, política são referências que devemos
descobrir na nossa vivência real em nossa prática. É a reflexão que
transforma o processo social educativo em busca de uma significação mais
profunda para a vida e o para o trabalho.
O educador competente
terá de ser exigente, sua formação deverá ser a formação de um
intelectual atuante no processo de transformação de um sistema
autoritário e repressivo: o rigor será uma exigência para sua prática. O
educador se contribuirá da filosofia para a educação e reflexão crítica
a busca de sua compreensão.
A visão do professor e de educação é de
mediar a ação mediadora. A relação professor-aluno. Educador-educando, é
a aquisição do conhecimento, onde ambos são sujeitos conhecedores. O
professor estabelece o diálogo do aluno como o real. O objeto que é o
mundo é apreendido, compreendido e alterado, numa relação que é
fundamental – a relação aluno-mundo. O professor é quem especifica a
mediação do saber entre o aluno e a cultura e a realidade.
Há fatores
intra e extra-escolares que interferem na prática dos educadores. É no
cotidiano de nossas práticas que estamos construindo a educação, que
estamos fazendo a história da educação brasileira. E é o educador que
vai encaminhar o educador que queremos ter. O desafio está na
necessidade de se superarem os problemas e se encontrarem / criarem
recursos para a transformação. Isso se concretiza na elaboração de
projetos de ação.
Ao organizar projetos, planejamos o trabalho que
temos a intenção de realizar, lançamos-nos para diante, olhamos para
frente, projetar é relacionar-se com o futuro, é começar a fazê-lo. O
presente traz no seu bojo o passado, enquanto vida incorporada e
memória. É isso que garante a significação do processo histórico.
Começamos a escola do futuro no presente. Quando se projeta, tem-se que
em mente um ideal. O ideal é utópico, mas é preciso recuperar o sentido
autentico de utopia, que é algo ainda não realizado.
A escola deve
desenvolver um trabalho coletivo e participante, tendo como pressuposto
que o trabalho que se realiza com a participação responsável de cada um
dos sujeitos envolvidos é o que atende de forma mais efetiva as
necessidades concretas da sociedade em que vivemos. É preciso que ele
seja possível . O que ainda não é pode vir a ser. O possível ainda não
está pronto, deve ser construído.
A idéia de projeto e a de utopia
está ligada à idéia de esperança, movimento, que é alimentada pela ação
do homem. A organização de projetos utópicos é uma forma de se enfrentar
as crises.
A história se faz na contraposição de valores, na
descoberta e instituição de novas significações para as ações e relações
humanas. Mas a crise pode configurar-se como uma ruptura, uma negação
de a própria dinâmica da cultura, uma ameaça de imobilidade, sob a forma
de um suposto movimento de desordem.
Cada momento histórico
apresenta aos homens um desafio. A crise ética em nossa sociedade
contemporânea é o grande desafio da competência. A crise moral é o
desafio a ética, porque significa uma indiferença diante de valores.
A atitude cínica nos provoca na medida em que é uma atitude de desconsideração das normas e dos valores que as sustentam.
Na
ação competente, haverá sempre um componente utópico no dever, no
compromisso, na responsabilidade. A competência é construída
cotidianamente e se propõe como um ideal a ser alcançado, ela é também
compartilhada, por outras pessoas, a qualidade de seu trabalho não
depende só de uma pessoa. A competência do profissional e na articulação
dessa competência com os outros e com as circunstâncias.
Na direção
do bem comum, da ampliação do poder de todos como condição de
participação na construção coletiva da sociedade e da histórica,
apresenta-se ao educador, como profissional, em meio a crise,. A
necessidade de responder ao desafio. Ele o fará tanto mais
competentemente quanto mais garantir em seu trabalho, no entre
cruzamento das dimensões que o constituem. A dimensão utópica. Esperança
a caminho.
domingo, 25 de agosto de 2013
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